quarta-feira, 22 de junho de 2011

Nasce uma profissão: o fotógrafo

Quando a França ainda vivia um período de instabilidade política, em meados do século XIX, conseqüência da Revolução Francesa e do Império Napoleônico, surgiu uma nova profissão, reconhecida mais tarde, também como arte: a fotografia.
No século X, o erudito árabe Alhazen mostrou como observar um eclipse solar no interior de uma câmara obscura: um quarto às escuras, com um pequeno orifício aberto para o exterior.
Durante a Renascença, uma lente foi colocada num pequeno orifício e obteu-se uma melhor qualidade da imagem. A câmara obscura começou a se tornar cada vez menor, até se transformar em um objeto que pudesse ser levado para qualquer lugar.
Já com um tamanho portátil, no século XVII, a câmara obscura era utilizada por muitos pintores na execução de suas obras.
Fotografia de fato, surgiu no verão de 1826, pelo inventor e litógrafo francês Joseph Nicéphore Niépce. Em fevereiro de 1827, Niépce recebeu uma carta de Louis Daguerre, de Paris, que manifestou seu interesse em gravar imagens. Em 1829, tornaram-se sócios, mas Niépce morre em 1833. Seis anos depois, em 7 de janeiro de 1839, Daguerre revela à Academia
Francesa de Ciências um processo que originava as fotografias ou os daguerreótipos.
A fotografia atraiu a atenção de tantas pessoas que, movidos pelo entusiasmo, tornaram-se adeptos daquela técnica. Assim, tanto em Londres como em Paris, houve um boom na compra de lentes e reagentes químicos.
Os fotógrafos e suas câmeras fotográficas (caixas de formas estranhas) começavam a registrar suas imagens.
Fotografar tornou-se uma atividade em franca expansão. Rapidamente tomou conta do mundo. Em 1853, cerca de 10 mil americanos produziram três milhões de fotos, e três anos mais tarde a Universidade de Londres já incluía em seu currículo a fotografia.
Em junho de 1888, com George Eastman, surge a Kodak. A fotografia tornou-se mais popular com este tipo de câmera que era bem mais leve, de baixo custo e simples de operar.
A fotografia deu ao homem um visão real do mundo, tornando-se assim, um instrumento de como captar imagens dos registros da História. 

Fotografia P&B 

A fotografia nasceu em preto e branco, mais precisamente como o preto sobre o branco, no início do século XIX. Desde as primeiras formas de fotografia que se popularizaram, como o daguerreótipo - aproximadamente na década de 1823 - até aos filmes preto e branco atuais, houve muita evolução técnica e diminuição dos custos. Os filmes atuais têm uma grande gama de tonalidade, superior até mesmo aos coloridos, resultando em fotos muito ricas em detalhes. Por isso, as fotos feitas com filmes PB são superiores as fotos coloridas convertidas em PB.


 Fotografia Colorida

A fotografia colorida foi explorada durante o século XIX e os experimentos iniciais em cores não puderam fixar a fotografia, nem prevenir a cor de enfraquecimento. Durante a metade daquele século as emulsões disponíveis ainda não eram totalmente capazes de serem sensibilizadas pela cor verde ou pela vermelha - a total sensibilidade a cor vermelha só foi obtida com êxito total no começo do século XX. A primeira fotografia colorida permanente foi tirada em 1861 pelo físico James Clerk Maxwell. O primeiro filme colorido, o Autocromo, somente chegou ao mercado no ano de 1907 e era baseado em pontos tingidos de extrato de batata.
O primeiro filme colorido moderno, o Kodachrome, foi introduzido em 1935 baseado em três emulsões coloridas. A maioria dos filmes coloridos modernos, exceto o Kodachrome, são baseados na tecnologia desenvolvida pela Agfa-color em 1936. O filme colorido instantâneo foi introduzido pela Polaroid em 1963.
A fotografia colorida pode formar imagens como uma transparência positiva, planejada para uso em projetor de slides (diapositivos) ou em negativos coloridos, planejado para uso de ampliações coloridas positivas em papel de revestimento especial. O último é atualmente a forma mais comum de filme fotográfico colorido (não digital), devido à introdução do equipamento de foto impressão automático.


 Fotografia Digital

É a fotografia tirada com uma câmera digital ou determinados modelos de telefone celular, resultando em um arquivo de computador que pode ser editado, impresso, enviado por e-mail ou armazenado em websites ou CD-ROMs.
A fotografia tradicional era um fardo considerável para os fotógrafos que trabalhavam em localidades distantes - como correspondentes de órgãos de imprensa - sem acesso às instalações de produção. Com o aumento da competição com a televisão, houve um aumento na urgência para se transferir imagens aos jornais mais rapidamente.
Na fotografia digital, a luz sensibiliza um sensor, chamado de CCD ou CMOS, que por sua vez converte a luz em um código eletrônico digital, uma matriz de números digitais (quadro com o valor das cores de todos os pixels da imagem), que será armazenado em um cartão de memória. Tipicamente, o conteúdo desta memória será mais tarde transferido para um computador. Já é possível também transferir os dados diretamente para uma impressora gerar uma imagem em papel, sem o uso de um computador. Uma vez transferida para fora do cartão de memória, este poderá ser apagado e reutilizado.




terça-feira, 21 de junho de 2011

Pop Art

Movimento principalmente americano e britânico, sua denominação foi empregada pela primeira vez em 1954, pelo crítico inglês Lawrence Alloway, para designar os produtos da cultura popular da civilização ocidental, sobretudo os que eram provenientes dos Estados Unidos.
Com raízes no dadaísmo de Marcel Duchamp, o pop art começou a tomar forma no final da década de 1950, quando alguns artistas, após estudar os símbolos e produtos do mundo da propaganda nos Estados Unidos, passaram a transformá-los em tema de suas obras. 

Representavam, assim, os componentes mais ostensivos da cultura popular, de poderosa influência na vida cotidiana na segunda metade do século XX. Era a volta a uma arte figurativa, em oposição ao expressionismo abstrato que dominava a cena estética desde o final da segunda guerra. Sua iconografia era a da televisão, da fotografia, dos quadrinhos, do cinema e da publicidade. 

Com o objetivo da crítica irônica do bombardeamento da sociedade pelos objetos de consumo, ela operava com signos estéticos massificados da publicidade, quadrinhos, ilustrações e designam, usando como materiais principais, tinta acrílica, ilustrações e designs, usando como materiais, usando como materiais principais, tinta acrílica, poliéster, látex, produtos com cores intensas, brilhantes e vibrantes, reproduzindo objetos do cotidiano em tamanho consideravelmente grande, transformando o real em hiper-real. Mas ao mesmo tempo que produzia a crítica, a Pop Art se apoiava e necessitava dos objetivos de consumo, nos quais se inspirava e muitas vezes o próprio aumento do consumo, como aconteceu por exemplo, com as Sopas Campbell, de Andy Warhol, um dos principais artistas da Pop Art. Além disso, muito do que era considerado brega, virou moda, e já que tanto o gosto, como a arte tem um determinado valor e significado conforme o contexto histórico em que se realiza, a Pop Art proporcionou a transformação do que era considerado vulgar, em refinado, e aproximou a arte das massas, desmitificando, já que se utilizava de objetos próprios delas, a arte para poucos.

Principais Artistas:
 
Robert Rauschenberg (1925).
Depois das séries de superfícies brancas ou pretas reforçadas com jornal amassado do início da década de 1950, Rauschenberg criou as pinturas "combinadas", com garrafas de Coca-Cola, embalagens de produtos industrializados e pássaros empalhados.
Por volta de 1962, adotou a técnica de impressão em silk-screen para aplicar imagens fotográficas a grandes extensões da tela e unificava a composição por meio de grossas pinceladas de tinta. Esses trabalhos tiveram como temas episódios da história americana moderna e da cultura popular. 


Roy Lichtenstein (1923-1997). 
Seu interesse pelas histórias em quadrinhos como tema artístico começou provavelmente com uma pintura do camundongo Mickey, que realizou em 1960 para os filhos. Em seus quadros a óleo e tinta acrílica, ampliou as características das histórias em quadrinhos e dos anúncios comerciais, e reproduziu a mão, com fidelidade, os procedimentos gráficos. Empregou, por exemplo, uma técnica pontilhista para simular os pontos reticulados das historietas. Cores brilhantes, planas e limitadas, delineadas por um traço negro, contribuíam para o intenso impacto visual.
Com essas obras, o artista pretendia oferecer uma reflexão sobre a linguagem e as formas artísticas. Seus quadros, desvinculados do contexto de uma história, aparecem como imagens frias, intelectuais, símbolos ambíguos do mundo moderno. O resultado é a combinação de arte comercial e abstração.

Andy Warhol (1927-1987). 
Ele foi figura mais conhecida e mais controvertida do pop art, Warhol mostrou sua concepção da produção mecânica da imagem em substituição ao trabalho manual numa série de retratos de ídolos da música popular e do cinema, como Elvis Presley e Marilyn Monroe. Warhol entendia as personalidades públicas como figuras impessoais e vazias, apesar da ascensão social e da celebridade. Da mesma forma, e usando sobretudo a técnica de serigrafia, destacou a impessoalidade do objeto produzido em massa para o consumo, como garrafas de Coca-Cola, as latas de sopa Campbell, automóveis, crucifixos e dinheiro.
Produziu filmes e discos de um grupo musical, incentivou o trabalho de outros artistas e uma revista mensal.


NO BRASIL

A década de 60 foi de grande efervescência para as artes plásticas no pais. Os artistas brasileiros também assimilaram os expedientes da pop art como o uso das impressões em silkscreen e as referências aos gibis. Dentre os principais artistas estão Duke Lee, Baravelli, Fajardo, Nasser, Resende, De Tozzi, Aguilar e Antonio Henrique Amaral.
A obra de Andy Warhol expunha uma visão irônica da cultura de massa. No Brasil, seu espírito foi subvertido, pois, nosso pop usou da mesma linguagem, mas transformou-a  em instrumento de denúncia política e social.



quarta-feira, 15 de junho de 2011

Montevideo - Meus olhares

Verão 2010

RIMBAUD

A ETERNIDADE
    
Tradução:  Augusto de Campos

De novo me invade.
Quem?
A Eternidade.
É o mar que se vai
Como o sol que cai.

Alma sentinela,
Ensina-me o jogo
Da noite que gela
E do dia em fogo.

Das lides humanas,
Das palmas e vaias,
Já te desenganas
E no ar te espraias.

De outra nenhuma,
Brasas de cetim,
O Dever se esfuma
Sem dizer: enfim.

Lá não há esperança
E não há futuro.
Ciência e paciência,
Suplício seguro.

De novo me invade.
Quem?
A Eternidade.
É o mar que se vai
Com o sol que cai.


L'ETERNITÉ

Clarice Lispector - Contos

Cem Anos de Perdão

Quem nunca roubou não vai me entender. E quem nunca roubou rosas, então é que jamais poderá me entender. Eu, em pequena, roubava rosas.
Havia em Recife inúmeras ruas, as ruas dos ricos, ladeadas por palacetes que ficavam no centro de grandes jardins. Eu e uma amiguinha brincávamos muito de decidir a quem pertenciam os palacetes. "Aquele branco é meu." "Não, eu já disse que os brancos são meus." Parávamos às vezes longo tempo, a cara imprensada nas grades, olhando.
Começou assim. Numa dessas brincadeiras de "essa casa é minha", paramos diante de uma que parecia um pequeno castelo. No fundo via-se o imenso pomar. E, à frente, em canteiros bem ajardinados, estavam plantadas as flores.
Bem, mas isolada no seu canteiro estava uma rosa apenas entreaberta cor-de-rosa-vivo. Fiquei feito boba, olhando com admiração aquela rosa altaneira que nem mulher feita ainda não era. E então aconteceu: do fundo de meu coração, eu queria aquela rosa para mim. Eu queria, ah como eu queria. E não havia jeito de obtê-la. Se o jardineiro estivesse por ali, pediria a rosa, mesmo sabendo que ele nos expulsaria como se expulsam moleques. Não havia jardineiro à vista, ninguém. E as janelas, por causa do sol, estavam de venezianas fechadas. Era uma rua onde não passavam bondes e raro era o carro que aparecia. No meio do meu silêncio e do silêncio da rosa, havia o meu desejo de possuí-la como coisa só minha. Eu queria poder pegar nela. Queria cheirá-la até sentir a vista escura de tanta tonteira de perfume.
Então não pude mais. O plano se formou em mim instantaneamente, cheio de paixão. Mas, como boa realizadora que eu era, raciocinei friamente com minha amiguinha, explicando-lhe qual seria o seu papel: vigiar as janelas da casa ou a aproximação ainda possível do jardineiro, vigiar os transeuntes raros na rua. Enquanto isso, entreabri lentamente o portão de grades um pouco enferrujadas, contando já com o leve rangido. Entreabri somente o bastante para que meu esguio corpo de menina pudesse passar. E, pé ante pé, mas veloz, andava pelos pedregulhos que rodeavam os canteiros. Até chegar à rosa foi um século de coração batendo.
Eis-me afinal diante dela. Para um instante, perigosamente, porque de perto ela é ainda mais linda. Finalmente começo a lhe quebrar o talo, arranhando-me com os espinhos, e chupando o sangue dos dedos.
E, de repente - ei-la toda na minha mão. A corrida de volta ao portão tinha também de ser sem barulho. Pelo portão que deixara entreaberto, passei segurando a rosa. E então nós duas pálidas, eu e a rosa, corremos literalmente para longe da casa.
O que é que fazia eu com a rosa? Fazia isso: ela era minha.
Levei-a para casa, coloquei-a num copo d'água, onde ficou soberana, de pétalas grossas e aveludadas, com vários entretons de rosa-chá. No centro dela a cor se concentrava mais e seu coração quase parecia vermelho.
Foi tão bom.
Foi tão bom que simplesmente passei a roubar rosas. O processo era sempre o mesmo: a menina vigiando, eu entrando, eu quebrando o talo e fugindo com a rosa na mão. Sempre com o coração batendo e sempre com aquela glória que ninguém me tirava.
Também roubava pitangas. Havia uma igreja presbiteriana perto de casa, rodeada por uma sebe verde, alta e tão densa que impossibilitava a visão da igreja. Nunca cheguei a vê-la, além de uma ponta de telhado. A sebe era de pitangueira. Mas pitangas são frutas que se escondem: eu não via nenhuma. Então, olhando antes para os lados para ver se ninguém vinha, eu metia a mão por entre as grades, mergulhava-a dentro da sebe e começava a apalpar até meus dedos sentirem o úmido da frutinha. Muitas vezes na minha pressa, eu esmagava uma pitanga madura demais com os dedos que ficavam como ensangüentados. Colhia várias que ia comendo ali mesmo, umas até verdes demais, que eu jogava fora.
Nunca ninguém soube. Não me arrependo: ladrão de rosas e de pitangas tem 100 anos de perdão. As pitangas, por exemplo, são elas mesmas que pedem para ser colhidas, em vez de amadurecer e morrer no galho, virgens.

Clarice Lispector - Contos

Felicidade Clandestina
Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente crespos, meio arruivados. Tinha um busto enorme, enquanto nós todas ainda éramos achatadas. Como se não bastasse, enchia os dois bolsos da blusa, por cima do busto, com balas. Mas possuía o que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de ter: um pai dono de livraria.
Pouco aproveitava. E nós menos ainda: até para aniversário, em vez de pelo menos um livrinho barato, ela nos entregava em mãos um cartão-postal da loja do pai. Ainda por cima era de paisagem do Recife mesmo, onde morávamos, com suas pontes mais do que vistas. Atrás escrevia com letra bordadíssima palavras como "data natalícia" e "saudade".
Mas que talento tinha para a crueldade. Ela toda era pura vingança, chupando balas com barulho. Como essa menina devia nos odiar, nós que éramos imperdoavelmente bonitinhas, esguias, altinhas, de cabelos livres. Comigo exerceu com calma ferocidade o seu sadismo. Na minha ânsia de ler, eu nem notava as humilhações a que ela me submetia: continuava a implorar-lhe emprestados os livros que ela não lia.
Até que veio para ela o magno dia de começar a exercer sobre mim uma tortura chinesa. Como casualmente, informou-me que possuía As reinações de Narizinho, de Monteiro Lobato.
Era um livro grosso, meu Deus, era um livro para se ficar vivendo com ele, comendo-o, dormindo-o. E, completamente acima de minhas posses. Disse-me que eu passasse pela sua casa no dia seguinte e que ela o emprestaria.
Até o dia seguinte eu me transformei na própria esperança de alegria: eu não vivia, nadava devagar num mar suave, as ondas me levavam e me traziam.
No dia seguinte fui à sua casa, literalmente correndo. Ela não morava num sobrado como eu, e sim numa casa. Não me mandou entrar. Olhando bem para meus olhos, disse-me que havia emprestado o livro a outra menina, e que eu voltasse no dia seguinte para buscá-lo. Boquiaberta, saí devagar, mas em breve a esperança de novo me tomava toda e eu recomeçava na rua a andar pulando, que era o meu modo estranho de andar pelas ruas de Recife. Dessa vez nem caí: guiava-me a promessa do livro, o dia seguinte viria, os dias seguintes seriam mais tarde a minha vida inteira, o amor pelo mundo me esperava, andei pulando pelas ruas como sempre e não caí nenhuma vez.
Mas não ficou simplesmente nisso. O plano secreto da filha do dono da livraria era tranqüilo e diabólico. No dia seguinte lá estava eu à porta de sua casa, com um sorriso e o coração batendo. Para ouvir a resposta calma: o livro ainda não estava em seu poder, que eu voltasse no dia seguinte. Mal sabia eu como mais tarde, no decorrer da vida, o drama do "dia seguinte" com ela ia se repetir com meu coração batendo.
E assim continuou. Quanto tempo? Não sei. Ela sabia que era tempo indefinido, enquanto o fel não escorresse todo de seu corpo grosso. Eu já começara a adivinhar que ela me escolhera para eu sofrer, às vezes adivinho. Mas, adivinhando mesmo, às vezes aceito: como se quem quer me fazer sofrer esteja precisando danadamente que eu sofra.
Quanto tempo? Eu ia diariamente à sua casa, sem faltar um dia sequer. Às vezes ela dizia: pois o livro esteve comigo ontem de tarde, mas você só veio de manhã, de modo que o emprestei a outra menina. E eu, que não era dada a olheiras, sentia as olheiras se cavando sob os meus olhos espantados.
Até que um dia, quando eu estava à porta de sua casa, ouvindo humilde e silenciosa a sua recusa, apareceu sua mãe. Ela devia estar estranhando a aparição muda e diária daquela menina à porta de sua casa. Pediu explicações a nós duas. Houve uma confusão silenciosa, entrecortada de palavras pouco elucidativas. A senhora achava cada vez mais estranho o fato de não estar entendendo. Até que essa mãe boa entendeu. Voltou-se para a filha e com enorme surpresa exclamou: mas este livro nunca saiu daqui de casa e você nem quis ler!
E o pior para essa mulher não era a descoberta do que acontecia. Devia ser a descoberta horrorizada da filha que tinha. Ela nos espiava em silêncio: a potência de perversidade de sua filha desconhecida e a menina loura em pé à porta, exausta, ao vento das ruas de Recife. Foi então que, finalmente se refazendo, disse firme e calma para a filha: você vai emprestar o livro agora mesmo. E para mim: "E você fica com o livro por quanto tempo quiser." Entendem? Valia mais do que me dar o livro: "pelo tempo que eu quisesse" é tudo o que uma pessoa, grande ou pequena, pode ter a ousadia de querer.
Como contar o que se seguiu? Eu estava estonteada, e assim recebi o livro na mão. Acho que eu não disse nada. Peguei o livro. Não, não saí pulando como sempre. Saí andando bem devagar. Sei que segurava o livro grosso com as duas mãos, comprimindo-o contra o peito. Quanto tempo levei até chegar em casa, também pouco importa. Meu peito estava quente, meu coração pensativo.
Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha, só para depois ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instantes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. A felicidade sempre ia ser clandestina para mim. Parece que eu já pressentia. Como demorei! Eu vivia no ar... Havia orgulho e pudor em mim. Eu era uma rainha delicada.
Às vezes sentava-me na rede, balançando-me com o livro aberto no colo, sem tocá-lo, em êxtase puríssimo.
Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante.

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Corações Psicodélicos

Ainda me lembro daquele beijo, spank punk violento
Iluminando o céu cinzento, eu quero você inteira
Gosto muito do seu jeito, qualquer nota bossa nova
Bossa nova qualquer nota, eu quero você na veia
E a vida passa na TV
E o meu caso é com você
Fico louco sem saber
Sim pro sol, sim pra lua
Eu quero você toda nua
Sim pra tudo que você quiser
Gosto muito do seu jeito, rock'n roll meio nonsense
Rock'n roll meio nonsense, pra acabar com essa inocência
E o complexo de decência, no meio do salão
E a vida passa na TV
E o meu caso é com você
Fico louco sem saber
Sim pro sol, sim pra lua
Eu quero você toda nua
Sim pra tudo que você quiser
Hoje é festa na floresta, toda tribo ateia som
Toda taba ateia sol, só tomando água de coco
Infeliz de quem tá triste
No meio dessa confusão

Fotos do vulcão Puyehue, em erupção no Chile dia 04/06/2011







Espetáculo da Natureza

terça-feira, 7 de junho de 2011

Dica: Fundação Iberê Camargo

No próximo dia 9, das 19h às 21h, a Fundação Iberê Camargo inaugura a exposição Iberê Camargo e o ambiente cultural brasileiro do pós-guerra, nova mostra temporária a ocupar o segundo e o terceiro andares da sede da instituição. Com a produção abstracionista de Iberê, iniciada em 1959, como centro do projeto curatorial, o objetivo principal da exposição não é examiná-la em profundidade: antes, o curador e crítico de arte Fernando Cocchiarale buscou reunir um conjunto de 133 obras capaz de criar um panorama das tendências artísticas observadas no Brasil a partir da década de 1950. Assim, além do próprio Iberê estão na exposição trabalhos de outros 23 artistas: Alfredo Volpi, Aluisio Carvão, Amílcar de Castro, Anna Bella Geiger, Antonio Bandeira, Arthur Piza, Décio Vieira, Edith Behring, Fayga Ostrower, Hélio Oiticica, Hércules Barsotti, Hermelindo Fiaminghi, Ione Saldanha, Ivan Serpa, Judith Lauand, Luiz Sacilotto, Lygia Clark, Lygia Pape, Manabu Mabe, Maria Bonomi, Maria Leontina, Milton Dacosta, Waldemar Cordeiro e Willys de Castro.
A produção desses artistas tem como pano de fundo o período imediatamente posterior ao fim da II Guerra Mundial, quando, nas palavras do curador, “a arte moderna brasileira ainda gravitava em torno de questões que não eram própria e exclusivamente artísticas” – diferentes, portanto, do que acontecia no modernismo europeu. “Centrado na denúncia da grave questão social brasileira, o realismo social de esquerda, então hegemônico, restringiu sua radicalidade à esfera temática, sem avançar na revolução plástico-formal levada a cabo pelas vanguardas europeias”, explica Cocchiarale.
No entanto, após o sucesso dos aliados na II Guerra, houve uma grande propagação de ideais democrático-liberais nos países vencedores. Assim, o totalitarismo do Estado Novo de Getúlio Vargas passou a ser questionado, e ocorreu no Brasil uma série de mudanças políticas. Nesse contexto, os artistas emergentes do cenário nacional já não tinham suas atenções voltadas especificamente para os problemas sociais do país. Ao invés disso, a nova geração que surgia nas duas maiores cidades do país, Rio de Janeiro e São Paulo, direcionou sua atenção para aspectos essencialmente formalistas, defendendo uma abordagem estética que fosse livre de associações com as formas existentes na natureza. Mas este processo não se deu apenas no âmbito coletivo: alguns artistas de trajetórias solitárias, como era o caso de Iberê Camargo, também deixaram progressivamente de lado o figurativismo em busca de novas possibilidades expressivas.
Portanto, o objetivo da exposição é mostrar ao público a transformação conceitual pela qual a arte brasileira passou entre as décadas de 1950 e 1970. Embora as obras da mostra revelem o caráter heterogêneo da produção do período, é possível apontar duas correntes principais: a dos concretistas, que projetavam sua obra racionalmente e a priori, e a dos abstracionistas, cujo trabalho final era determinado predominantemente durante o processo de execução. Para Cocchiarale, a identificação de cada um dos artistas com um destes dois grupos é determinante para que se compreenda a produção da época. “Informar ao público sobre o modo com o qual trabalhavam tornou-se essencial à estratégia do texto crítico. E esse encontro do ‘eu’, de caráter individual, com a história, de caráter coletivo, talvez tenha sido o único pressuposto estético e ético da abstração informal, embora fundado, paradoxalmente, na consciência eminentemente individual que eles tinham a respeito de seus processos de criação”, ele justifica.
Iberê Camargo e o ambiente cultural brasileira do pós-guerra pode ser visitada de 10 de junho a 28 de agosto, de terça a domingo, das 12h às 19h (nas quintas, até as 21h). A Fundação Iberê Camargo fica na Av. Padre Cacique, 2000. A entrada é franca.

The Doors, de Oliver Stone

Uma das mais sensuais e excitantes figuras da história do rock explode nas telas em The Doors, um filme eletrizante sobre o homem, o mito, a música e a magia que foi Jim Morrison. Morrison (Val Kilmer), deus do sexo. Alto Sacerdote do excesso. Um poeta disfarçado na pele de um astro do rock. As mulheres o desejam, os homens desejam ser como ele. Numa época chamada anos 60, num lugar chamado Estados Unidos, nenhum sonho era mais brilhante do que ser o líder de uma banda de rock chamada The Doors.
  • The Doors levou cerca de 20 anos para ser enfim produzido. Neste período vários atores estiveram cotados para interpretar Jim Morrison, entre eles John Travolta, Tom Cruise e Jason Patric;
  • No período em que John Travolta esteve cotado para o filme, foi cogitada a possibilidade de que os demais integrantes do The Doors retornassem com a banda, com o ator assumindo os vocais;
  • Ian Astbury, cantor da banda The Cult, foi cogitado por Oliver Stone para interpretar Jim Morrison;
  • Antes mesmo de fazer seu teste para o personagem, Val Kilmer memorizou as letras de todas as músicas compostas por Jim Morrison. Além disto ele enviou ao diretor Oliver Stone um vídeo, com sua performance cantando as músicas;
  • Este é o 1º de 2 filmes em que o diretor Oliver Stone e o ator Val Kilmer trabalham juntos. O posterior foi Alexandre (2004);
  • As filmagens ocorreram entre 19 de março e 20 de junho de 1990;
  • Val Kilmer usou lentes de contato especiais nas cenas em que Jim Morrison estava sob o efeito de drogas, para que suas pupilas ficassem dilatadas;
  • Nas cenas de close é ouvida a voz do próprio Val Kilmer, enquanto que nas distantes é ouvida a de Jim Morrison;
  • Val Kilmer quebrou o braço durante as filmagens, ao rodar uma cena em que pulava na multidão;
  • Inicialmente a participação de Billy Idol em The Doors seria bem maior. Na época das filmagens o cantor sofreu um sério acidente de moto, que o deixou impossibilitado de andar. Desta forma, sua participação foi bastante reduzida no filme;
  • O poema que Jim Morrison lê logo na abertura do filme é na verdade a seleção de dois trechos de seu livro de poesias, "An American Prayer". As poesias são "Awake Ghost Song" e "Awake";
  • Oliver Stone fez diversos apelos para que Ray Manzarek, tecladista do The Doors, trabalhasse como consultor no filme. Manzarek não apenas recusou o convite, como posteriormente declarou que The Doors conta de forma horrível a história da banda;
  • Robbie Krieger, guitarrista do The Doors, aceitou ser consultor do filme por considerar o trabalho anterior de Oliver Stone, Salvador - O Martírio de um Povo (1986), um de seus filmes prediletos;
  • John Densmore, baterista do The Doors, fez uma pequena ponta como o engenheiro de som na cena de solo com a guitarra de Jim Morrison;
  • O verdadeiro túmulo de Jim Morrison é exibido ao término do filme. Na época a lápide foi trocada e as pixações foram retiradas, atendendo a pedidos da família do cantor;
  • O orçamento de The Doors foi de US$ 38 milhões.

The Doors - People are Strange

Carlos Drummond de Andrade

Quando encontrar alguém e esse alguém fizer seu coração parar de funcionar por alguns segundos, preste atenção: pode ser a pessoa mais importante da sua vida.
Se os olhares se cruzarem e, neste momento, houver o mesmo brilho intenso entre eles, fique alerta: pode ser a pessoa que você está esperando desde o dia em que nasceu.
Se o toque dos lábios for intenso, se o beijo for apaixonante, e os olhos se encherem d’água neste momento, perceba: existe algo mágico entre vocês.
Se o primeiro e o último pensamento do seu dia for essa pessoa, se a vontade de ficar juntos chegar a apertar o coração, agradeça: Deus te mandou um presente: O Amor.
Por isso, preste atenção nos sinais – não deixe que as loucuras do dia-a-dia o deixem cego para a melhor coisa da vida: O AMOR.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Via Láctea em foco

 
Youtube TesoPhotography
 
Youtube TesoPhotography
 
Youtube TesoPhotography

Longe das luzes das grandes cidades, no topo de uma montanha de mais de 3.700 metros: é assim que a Via Láctea aparece no céu à noite. O fotógrafo norueguês Tisso passou uma semana no alto monte El Teide, nas Ilhas Canárias, território espanhol no Oceano Atlântico. Para fazer os vídeos, ele passou horas tirando uma foto por minuto de um mesmo ponto do céu. Como a terra gira, cada fotografia capta uma posição um pouco diferente das estrelas. Quando coloca todas as imagens em sequência, Tisso cria um filme do céu.
Ele conta que as séries de fotos para criar esses vídeos duravam até seis horas, e o resultado são filmes de poucos segundos, mas de beleza indescritível. Durante os dias, Tisso aproveitava para fazer sequências das paisagens da ilha. Ele fala que passou o tempo todo no alto da montanha, quase sem dormir, para fazer o máximo de sequências possível. Tisso conclui: “apesar de todo o trabalho, é uma forma maravilhosa de curtir a vida ao ar livre”.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Nei Lisboa - Amém

"Porto Alegre e Montevidéu não se conhecem o tanto que deveriam, não me canso de dizer. São cidades de porte semelhante, irmanadas pelo clima, pela história sócio-política e com razoável proximidade geográfica dentro do Mercosul. E têm, nas suas especificidades, muito a oferecer uma à outra. Essa idéia é o ponto de partida de Amém, disco que carrega uma forte declaração de amor ao Uruguai e à resistência possível que ele representa. Foi reencontrando velhos amigos/músicos uruguaios, e sendo apresentado a outros tantos, que esse trabalho começou a surgir, em 1991. Por dois anos trocamos figurinhas, travando contato com a música e com músicos daqui e de lá, entre algumas temporadas de shows e composições que se agregavam sob o signo do candombe, até gravarmos ao vivo no Theatro São Pedro. O trompete de Jorginho, a maestria de Mauricio Trobo e Lobo Nuñez, o desempenho de toda a banda, enfim, e o calor do público comandam o espetáculo. Tal qual a superação de barreiras e preconceitos que ainda persistem entre vizinhos tão próximos, olho para esse trabalho como um desafio difícil mas alegremente percorrido, uma proposta que um dia há de aprofundar-se a derrubar fronteiras e quem sabe - se me permitem uma certa soberba provocativa - encontrar no futuro a sua época."
Nei Lisboa

Nei Lisboa: como é bom!

JEAN-PAUL SARTRE

Vida. Jean-Paul Sartre, novelista francês, teatrólogo, e maior intelectual do Existencialismo, - filosofia que proclama a total liberdade do ser humano. Foi premiado com o Nobel de literatura de 1964, que desconsiderou. 

Infância e juventude. Sartre nasceu em 21 de junho de 1905 e faleceu em 15 de abril de 1980, em Paris. Ficou órfão de pai muito cedo. O pai, oficial da marinha, faleceu ainda jovem, dois anos depois do nascimento do filho. Foi, com sua mãe, Anne-Marie Schweitzer, viver em casa de seu avô materno, Carl Schweitzer, de origem alsaciana e protestante, professor de Alemão na Sorbone, em um apartamento no sexto andar de um edifício em Meudon, nos arredores da capital, nas proximidades do Jardim de Luxemburgo. O célebre pastor Albert Schweitzer, prêmio Nobel da Paz de 1952, era sobrinho de seu avô, primo de sua mãe. 

Sartre estudou primeiro no Liceu Henrique IV, em Paris. Mais tarde estudou no liceu em La Rochelle, localidade onde, tendo sua mãe se casado segunda vez, a pequena família passou a residir.

Após o liceu completou sua educação ingressando em 1924 na École Normale Supériure, onde se graduou em 1929. Ainda estudante passou a viver com Simone de Beauvoir (1908-1986) de quem nunca se separou. Na École Normale foi contemporâneo de escritores que viriam a ser intelectuais de renome, como Raymond Aron, Maurice Merleau-Ponty, Emmanuel Mounier, Jean Hippolyte, Claude Lévi-Strauss e a filósofa social esquerdista da escritora Simone Weil, (1909-1943) ativista na Resistência à invasão alemã e ao nazismo, cujas obras publicadas postumamente tiveram grande influência no pensamento social na França e na Inglaterra..
Terminado o curso de filosofia, fez serviço militar em Tours, como meteorologista.

Nos anos que precederam a grande guerra Sartre lecionou, entre 1931 e 1933, no Liceu do Havre; em 1933-34 esteve em Berlim, estudando fenomenologia. De 1934 a 1939 continuou no Havre passando depois para Neuilly-sur-Seine. 

Na Alemanha Sartre iniciou a redação de "Melancolia", romance recusado pelos editores e mais tarde publicado com o título "A Náusea".

Influências. No período de um ano passado em Berlim, Sartre estudou a fenomenologia do filosofo alemão Edmund Husserl (1859-1938), as teorias do existencialismo de Heidegger e Karl Jasper (1883-1969) e a filosofia de Max Scheller (1874-1928). A partir desses autores, chegou a Soren Kierkegaard (1813-1855).

Durante os anos que lecionou no Havre, Sartre publicou suas primeiras obras, "A Imaginação" e "A Transcendência do Ego". Nelas, a começar por L'Imagination (1936 - "A Imaginação"), explora o método fenomenológico de Husserl, que propõe a descrição dos objetos como fenômenos mentais sem qualquer idéia preconcebida ou preconceituosa. Porém, foi a publicação do La Nausée (1938 - "A Náusea") que lhe trouxe fama. Esse romance, escrito em forma de um diário, revela os sentimentos de repugnância do personagem Roquentin, em relação ao mundo material inclusive pela consciência de seu próprio corpo. O romance contem em suas páginas grande parte das posições filosóficas que Sartre continuaria depois a desenvolver. Seu herói, Antoine Roquentin, desocupado, duvidoso de si mesmo, vive sozinho, sem amigos, sem amante, nada lhe importando, nem os outros homens, nem ele mesmo, descobre, na vida monótona de Bouville, o mistério metafísico do Ser: o mundo não tem nenhuma razão de existir e é absurdo que exista. "Tudo é gratuito, a jardim, esta cidade, e eu mesmo; quando acontece da gente se dar conta disso, isso atinge o cabeça e tudo começa a flutuar; eis a náusea". Em A 'Náusea, Sartre parece bastante próximo de Heidegger. 

No ano seguinte, publicou "O Muro" (1939), uma coletânea de contos, e o ensaio Esquisse d'une théorie des émotions (1939 - "Esboço de uma teoria das Emoções"). O muro tem por personagem Pablo Ibietta, é uma denuncia do regime do ditador Franco, da Espanha, sob cujo poder o personagem Pablo Ibietta é preso e torturado. No ano seguinte publicou L'Imaginaire: Psychologie phénoménologique de l'imagination (1940 - "O Imaginário: Psicologia fenomenológica da Imaginação"), um ensaio. 

Período da II Grande Guerra. Na primeira fase da guerra mundial Sartre serviu como meteorologista na Lorena, 1940. Caiu prisioneiro quando Hitler invadiu a França, e foi encerrado no campo de concentração de Trier (Treves), na Alemanha ocidental, cidade junto à fronteira com Luxemburgo que foi berço de Karl Marx. No período de sua prisão Sartre escreveu uma peça de teatro que depois não quis contar entre os títulos de suas obras, alegando que fora um trabalho dentro de um contexto particular, e que a havia escrito apenas para levantar o ânimo de seus companheiros de infortúnio. É uma peça natalina, representada pelos prisioneiros no Natal de 1940, e publicada 30 anos mais tarde com o título Bariona, ou Le fils du tonnerre ( "Bariona, ou O filho do trovão"). O drama, de inspiração religiosa, fala de Jesus e de Maria, Sua mãe, que "Trouxe-o no ventre durante nove meses, oferecer-Ihe-á o seio e o seu leite se tornará o sangue de Deus". Foi solto por razões médicas (por um alegado problema de visão) um ano mais tarde, na primavera de 1941. Em liberdade, voltou ao Liceu de Neuilly, passando depois a lecionar no Liceu Condorcet e no Liceu Pasteur, em Paris. Fundou então o grupo Socialismo e Liberdade a fim de atuar junto à Resistência. O grupo produziu panfletos clandestinos contra a ocupação alemã e contra os colaboracionistas franceses. 

Em 1943, em plena fase da guerra, fez a primeira publicação de uma peça teatral, "As Moscas", que envolve veladamente o comando alemão e os colaboracionistas, e publicou também o famoso L'Être et le néant (1943 - "O Ser e o Nada"), obra fundamental da teoria existencialista. O "Ser e o Nada" subintitula-se "Ensaio de ontologia fenomenológica" e nele Sartre aprofunda seu pensamento com respeito à consciência humana, como "um nada" em oposição ao Ser. A consciência é "não-matéria", nada, e por isso mesmo escapa a qualquer determinismo. Sendo um "nada, ela "nadifica" seus objetos. A consciência é essencialmente negadora das coisas em-si mesmas, na medida em que se encontra revestida da característica ontológica de ser, ela própria, o seu próprio nada.

A teoria da negatividade da consciência não é senão uma das perspectivas do pensamento de Sartre. Outra é a de que o outro é o "mediador indispensável entre mim e mim mesmo"; precisamos de outrem para conhecer plenamente a nós mesmos. Mas a relação primordial com outrem é o conflito. Todo tipo de relação humana está condenado ao fracasso; através delas nunca atinjo o meu objetivo; a indiferença, o sadismo, o ódio, o masoquismo, o amor, a linguagem, são diversas manifestações da minha tentativa, sempre fracassada, de conviver com outrem. Essas obras e mais "Entre 4 paredes" (1944), rapidamente fizeram dele a mais célebre dos escritores franceses de seu tempo.

Segunda fase filosófica. Sartre lecionou até 1945. Nesse ano dissolveu o movimento Socialismo e Liberdade e fundou com Simone de Beauvoir, Merleau-Ponty (1908-1961), Raymnond Aron (1905-1983) e outros intelectuais, a revista de filosofia Les Temps Modernes ("Os Tempos Modernos"), deixando de lecionar para cuidar deste e de outros empreendimentos literários. 

Tendo em uma primeira fase exaltado a liberdade, que em suas obras anteriores parecia ter valor por si mesma, agora, após as lições da guerra, Sartre voltou sua atenção para o conceito de responsabilidade social. Nesta nova abordagem da questão da liberdade ele planejou, em 1945, uma novela em quatro volumes sob o titulo Les Chemins de la liberté ("Os Caminhos da Liberdade") dos quais publicou três: L'Âge de raison (1945 - "Idade da razão"), Le Sursis (1945 - "Sursis"), e La Mort dans l'âme (1949 - "Com a Morte na Alma"). 

Em lugar do quarto volume de "Os Caminhos da Liberdade", Sartre decidiu que o romance poderia não ser o melhor  veículo de suas mensagens e intensifica a produção de peças de teatro. Ele já havia produzido nessa área durante a guerra, e agora escreve vários: Les Mouches (1943), Huis-clos (1944), "Entre Quatro Paredes" (1945), "Mortos sem Sepultura" (1946) e "A Prostituta Respeitosa" (1946), Les Mains sales (1948 - "As mãos sujas"), e continua com Le Diable et le bon dieu (1951 - "O Diabo e o Bom Deus"), Nekrassov (1955), e Les Séquestrés d'Altona (1959 - Seqüestrados de Altona"), esta sobre o problema do colonialismo na Algéria Francesa. Todos essas peças fazem uma abordagem pessimista do relacionamento humano, enfatizando a hostilidade natural do homem para com seu semelhante, porém deixam antever uma possibilidade sempre presente de remissão e salvação.

De 1946 são os ensaios "O existencialismo é um Humanismo", escrito para esclarecer o significado ético do existencialismo, e "Reflexões sobre a Questão Judaica". Outras publicações da mesma época incluem um livro, Baudelaire (1947), um script para o cinema, "Os dadas estão lançados", na critica literária e psicológica "Baudelaire" e um estudo sobre o escritor e poeta francês Jean Genet, com o título Saint Genet, comédien et martyr (1952), "O Fantasma de Stalin (1956), e inúmeros artigos que foram publicados em seu jornal Les Temps Modernes. Porém em 1955 se desentende com Merleau-Ponty, com quem mantinha o jornal, por motivos políticos.

Últimos anos. Muito se tem conjecturado sobre as verdadeiras razões de haver Sartre recusado o prêmio Nobel, as quais, aparentemente, não estariam tão claras para ele mesmo, que acreditava na transparência da consciência. Porém, seria no seu próprio subconsciente, que ele negava existir, que talvez estivesse a resposta. Foi uma criança super-estimulada a ser inteligente e vencedora, o que no íntimo ele talvez não acreditasse ser, sentindo-se um impostor comparado ao célebre pastor, primo de sua mãe, e ao seu próprio avô, figura solene, vastas barbas brancas, que "assemelhava-se a Deus Pai", figuras e exemplos em que pivotaram os estímulos de sua educação infantil. Comparado a esses que seriam para ele os verdadeiros merecedores do prêmio Nobel, - e um deles de fato recebeu o prêmio, - Sartre confessa um idealismo, não uma prática da generosidade, e um certo remorso por não ter sofrido, onde diz, em "As Palavras": "Meu idealismo épico compensará até a minha morte uma afronta que não sofri, uma vergonha que não padeci..."

De 1960 até 1971 a atenção de Sartre concentrou-se no preparo de um estudo em quatro volumes sobre o famoso escritor francês Gustave Flaubert. Dois volumes, com um total de 2.130 páginas apareceu no início de 1971, contendo minuciosas análises freudianas da infância e das relações familiares de Flaubert. 

Atividades como conferencias e passeatas como meio de apressar a Revolução socialista passaram depois a ocupar boa parte do tempo de Sartre. Em 1961 viaja para Cuba e Brasil, e aqui foi festivamente recebido pelas esquerdas. Pouco escreveu em 1971. Apesar de tudo, em 1972 publicou o terceiro volume do trabalho sobre Flaubert, com o título L'Idiot de la famille ("O idiota da família"), igualmente denso e de leitura fastidiosa. 

Em seus últimos anos Sartre ficou cego e sua saúde declinou até seu falecimento em Abril de 1980 devido a um tumor pulmonar. Teve um funeral impressionante pela massa popular que compareceu, estimada em 25.000 pessoas. 

Sobre o aspecto meramente literário de sua obra, se diz que poderia ter colocado sua filosofia de uma forma mais clara e mais breve do que fez em "O Ser e o Nada".

Somos todas clandestinas

A aliança capitalismo–patriarcado faz de todas nós clandestinas.
Clandestinas, de uma ordem economicamente injusta e socialmente desigual.
E quando inventamos uma economia solidária, quando anunciamos que não pagaremos a conta da crise econômica mundial.
Clandestinas porque amamos uma outra mulher e denunciamos a lesbofobia renegante do direito de amar.
Clandestinas pela criminalização do aborto e quando negamos a função social da reprodução.
Clandestinas porque queremos ser donas dos nossos corpos e nossas vidas.
Clandestinas quando o patriarcado coloca na gaveta nossa produção literária e elaboração cientifica.
Clandestinas porque na desobediência civil denunciamos com ação direta o latifúndio improdutivo e a ameaça dos transgênicos e da monocultura, como uma ameaça à agricultura familiar, a soberania alimentar e a aceleração da degradação ambiental do planeta.
Clandestinas por querer desnaturalizar a hierarquização e valorização das tarefas socialmente definidas para homens e mulheres.
Somos todas clandestinas quando denunciamos a violência sexista e exigimos que a agressão, a violência física e psíquica, seja banida das nossas vidas, como uma condição para a igualdade.
Clandestinas quando cobramos a promessa constitucional de um Estado laico e de direitos sociais, econômicos e culturais, que até hoje não encontraram as mulheres.
Clandestinas quando realizamos o direito de manifestação e expressão e recebidas por um estado policialesco somos noticiadas como criminosas.
Somos clandestinas, porque queimamos na fogueira e porque hoje nossos corpos são vendidos como mais uma mercadoria: nas propagandas de cerveja, nas revistas de moda e nas prateleiras do varejo.
Clandestinas, quando cumprimos uma jornada de trabalho para receber 30% a menos do que os homens. E quando realizamos o trabalho doméstico, de cuidados e de manutenção da família, que fica invisível no cômputo geral da economia dos homens.
Somos clandestinas quando rechaçamos as guerras e hasteamos a bandeira da paz no mundo, contrapondo aqueles que lucram com a indústria bélica e produzem a morte de milhares de inocentes ao redor do planeta. Maioria mulheres e crianças.
Clandestinas porque denunciamos a intolerância, a desigualdade e a submissão entre os sexos.
Esta clandestinidade é o que nos faz marchar!

Texto de Sirlanda Selau

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Mário Quintana na voz de Paulo Autran (Áudio)


"Amar:
Fechei os
olhos
para não te ver
e a minha boca para não dizer...
E dos meus olhos fechados desceram lágrimas que não enxuguei,
e da minha boca fechada nasceram sussurros
e palavras mudas que te dediquei...

O amor é quando a gente mora um no outro."

Eres para mi

Pretinha

Tropeço

Nei Lisboa

Nei Lisboa é gaúcho de Caxias do Sul e reside em Porto Alegre desde os seis anos de idade, tendo vivido largas temporadas em outras capitais brasileiras e também nos EUA, onde concluiu o segundo grau. Mas sua ligação mais forte é mesmo com a capital gaúcha, onde mantém um público fiel, e mais especificamente o bairro Bom Fim, onde cresceu e morou por mais de vinte anos. É irmão mais jovem – entre sete – de Luiz Eurico Tejera Lisbôa, primeiro desaparecido político brasileiro cujo corpo pôde ser localizado, no final dos anos 70.
Nei tem nove discos lançados ao longo de mais de três décadas, além de dois livros: uma coletânea de crônicas e um romance, este editado no Brasil e na França. A paixão pela música popular surge na infância – aos oito anos é aluno do Liceu Musical Palestrina – e se consolida ao ingressar, em 1977, no curso (inconcluso) de Composição e Regência da UFRGS.

Discografia
  • Pra viajar no Cosmos não precisa gasolina (1983)
  • Noves Fora (1984)
  • Carecas da Jamaica (1987)
  • Hein?! (1988)
  • Amém (1993)
  • Hi-Fi (1998)
  • Cena Beatnik (2001)
  • Relógios de Sol (2003)
  • Translucidação (2006)
Bibliografia
  • Um Morto Pula a Janela (romance, ed. Artes & Ofícios, 1991)
  • É Foch! (crônicas, ed. L&PM, 2007)
Sites
http://www.neilisboa.com.br/
http://www.youtube.com/neilisboatv